Escola e redes sociais: combinação possível?
Escrito
em 05 julho, 2012
Escola e mídia. Duas instituições que estão cada vez mais
próximas e, ao mesmo tempo, distantes. Embora não faltem teorias,
estudos e cursos que defendam o trabalho conjunto entre elas, a
interface não é das melhores.Muitas escolas ainda não sabem
lidar com os meios de comunicação, cada vez mais presentes,
influentes e ao alcance de crianças desde a Educação Infantil.
Em
junho do ano passado,a mídia noticiou com grande destaque o caso da estudante Jannah Nebbeling, 15 anos, aluna do Colégio PH, no Rio de
Janeiro. Na época, ela disse ter sido coagida pela direção da
escola por ter criado uma comunidade no Facebook para debater
assuntos escolares e divulgar as respostas
dos deveres de casa que
valiam pontos. A página era acessada por cerca de 700 alunos. Para
a estudante, uma ação normal. Para a escola,uma cola virtual.
O
caso foi parar na polícia. A mãe da aluna processou a escola pela
forma como a instituição conduziu o problema: suspendeu a aluna
por cinco dias.A
escola diz ter chamado o responsável de cada aluno que estava
participando da comunidade para uma conversa particular, explicando
que se tratava de uma cola indevida, um processo não pedagógico.
A
revistapontocom conversou com especialistas nas
áreas de tecnologia e educação para contribuir com o debate.
Afinal, como é possível estabelecer uma interface criativa e
construtiva entre a escola e, hoje, as redes sociais?
Como
eles avaliam o caso da aluna? Que pontos positivos é possível
tirar deste caso?
Acompanhe:
Professor do Colégio Pedro II, Sérgio Lima afirma que a aluna fez
um “uso pobre” das redes sociais. “As respostas dos deveres
poderiam ter sido usadas para trocas de conhecimento entre os alunos,
para que todos aprendessem mais sobre as questões. Pelo que entendi,
as trocas tinham como único objetivo fraudar o sistema de notas da
escola. Logo, um uso conservador e limitado das possibilidades ricas
de aprendizagem que as redes sociais oportunizam”, destaca.
A ação
da aluna, na visão do professor, pode ser considerada como um
resultado conservador do sistema de avaliação da escola, que, de
certa forma, incentiva a necessidade dos alunos colarem. Para Sérgio,
se as escolas continuarem funcionando e propondo atividades
condizentes com os resquícios da sistematização da Era Industrial,
essas contradições serão cada vez mais frequentes. “Se a escola
mudar as formas de aprendizagem e avaliação, a cola poderá não
fazer mais sentido”, avalia.
Para o
professor, o episódio é um prato cheio para as escolas que desejam
continuar fechadas para o novo mundo tecnológico. Mas também é, ao
mesmo tempo, uma ótima reflexão para as que querem, de fato,
ampliar suas potencialidades e limites. “As escolas que querem uma
desculpa para continuarem no século XIX poderão tomar este episódio
como argumento a favor de seu neoludismo – uma ideologia que se
opõem às novas tecnologias. Já as escolas que sabem que os
desafios para se educar no nosso atual contexto informacional são
enormes tomarão este episódio como um convite para a reflexão”.
Tarefa
nada fácil. Afirma a professora Camila Lima Santana, do Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do IF Baiano. Ela
reconhece a dificuldade, pois as escolas estão enraizadas em
práticas lineares, segmentadas. E tudo que possibilite uma abertura,
uma novidade, um caminho em que não se saiba trilhar, dá medo. Mas
é preciso rever, refletir. “E reconhecer esses espaços digitais
para além do ócio e das inutilidades. É fundamental pensar as
redes sociai como locus de informação, de troca de saberes e
aprendizagem”, conta.
Na
avaliação de Camila, deixar de lado as tecnologias e, mais
especificamente as redes sociais, não é uma boa estratégia.
Afinal, as tecnologias são um elemento forte e contundente da atual
cultura contemporânea. As redes sociais, assim como as clássicas
instituições, como a escola, também favorecem a interação e a
constituição de conhecimentos e valores. Portanto, afirma a
professora, devem ser, pelo menos, objeto de discussão.
“É
preciso olhar para o que está disponível na rede e apropriar-se de
sua lógica para direcionar práticas pedagógicas e incentivar o
diálogo com esses espaços, pois neles circulam informações,
saberes e experiências, elementos fundamentais para o processo
educativo. É preciso aliar essa dinâmica à práxis, compreendê-la,
debatê-la e abrir as portas da escola para o mundo que a internet
representa”, afirma.
Mestre
em Educação e Contemporaneidade pela Universidade do Estado da
Bahia (Uneb), Camila destaca ainda que as redes sociais são espaços
de interação humana. “Os sites de redes sociais não são
culpados por atos de violência, agressão, cola, por nada. Os
sujeitos que agem dessa maneira na rede, agem em outros espaços. O
que a internet permite é que essas práticas sejam divulgadas e
atinjam maior número de pessoas. Somos nós, humanos, que fazemos os
espaços serem o que são e terem as utilidades que desejamos”.
Andrea
Ramal faz coro às observações de Camila. E vai mais além. Segundo
ela, que é especialista em novas tecnologias, a internet não é um
material didático pronto. É preciso que o uso de qualquer recurso,
inclusive das redes sociais, com finalidades educacionais, seja
fundamentado por um projeto pedagógico consistente. Para Andrea, o
limite começa a existir quando as redes sociais, em vez de servirem
para o desenvolvimento das pessoas e o crescimento dos estudantes,
por meio do compartilhamento de conhecimentos e da comunicação
intersubjetiva, começam a serem usadas com finalidades que ferem a
ética. Para a especialista, cabe aos educadores – na escola e na
família – orientarem os estudantes neste sentido.
“As
redes sociais potencializam as atividades que se realizam em grupo,
pois por meio delas os alunos podem se relacionar com outras pessoas.
Pode haver produção coletiva de conhecimento, numa espécie de rede
cooperativa de aprendizagem. Acredito que as redes sociais vão
ajudar a fazer da sala de aula um ambiente mais interativo e
dialógico, pois o modelo unidirecional da comunicação, no qual o
professor fala e o aluno ouve, será substituído pelo modelo das
redes em que todos os sujeitos têm vez e voz”.
Então
as escolas que usam as redes sociais no ensino estão a um passo à
frente das que não usam? Para Andrea, estas escolas provavelmente
estão educando os alunos para conviver com naturalidade e
consciência no mundo digital. “Escolas que ainda não usam
precisam ficar atentas: podem estar educando os alunos ainda na
lógica do papel e da caneta, da comunicação bidirecional, dos
conhecimentos lineares. Mas as que usam também devem abrir os olhos:
“o uso de redes sociais na educação depende, sim, de um
planejamento pedagógico consistente”, pondera Andrea Ramal.
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